quinta-feira, 21 de março de 2013

A Parada de Ônibus #2

A mulher da assembleia. Ela tem uma aparência suburbana bastante humilde, provavelmente não mora por aqui. Acredito que venha diariamente para algo, mas tento me afastar do esteriótipo de que seja uma empregada. O que diabos ela faz por aqui? Ela carrega uma sacola enorme dessas de náilon que as donas carregam pela feirinha de domingo ali no mesmo bairro. Parecem roupas, mas é inconcebível a ideia de que ela esteja saindo da casa do patrão e indo a outro lugar às 7h da manhã. E aquela bíblia? Se ela soltasse ela e guardasse na bolsa não pesaria tanto assim. Então é isso.
A mulher da assembleia trabalha cedo pela manhã e não se incomoda de não estar em casa já que se acostumou a andar desde pequena, enquanto crescia nas ruas de barro do Recife do século passado. Na verdade mora em um apartamento de um prédio antigo ali mesmo nas Graças. Esse apartamento é seu maior orgulho, por ser sua casa própria e num dos bairros nobres, mas ao mesmo tempo sua maior sina, por ter o herdado em vida de seus pais e estar até hoje brigando pelo seu direito na justiça com seus irmãos que se mudaram para São Paulo.
Trabalha para pagar um advogado, fazer sua feira do mês e ajudar a sua igreja. Como a maioria das assembleias se encontram no subúrbio, ela pega um ônibus para Macaxeira onde sua amiga mora e sempre se encontram para tomarem café. Mas não naquela hora do dia. Pela manhã ela vai para Boa Vista onde trabalha vendendo roupa em uma daquelas barriquinhas odiadas pela prefeitura.
A fé é o que lhe sobra para cobrir a sua amargura. Apesar de saber o peso que tem que viver por ter tirado dos pais algo que eles tanto precisavam para poder ter a sua família com seu marido que pouco trabalhava. A vida lhe deu esse peso para carregar após que ela foi abandonada com três filhos pelo seu marido, que não passava de um bígamo.
Pobre mulher da assembleia. Como a sua vida pode sair desse estado de caos assustador? O que lhe resta? Apenas vive para concluir um ciclo. Parece ter desistido do novo. Desistiu de uma vida melhor para se tornar aquele avatar que senta perto de mim todo santo dia, debaixo daquele sol quente.

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